Muita atenção com a luxação do ombro!
Luxação do ombro é o nome que se dá à perda completa ou parcial da congruência desta articulação. Ela funciona como uma chave de boca em uma porca, ou como uma dobradiça, bem encaixadas. Chamamos de luxação quando esse encaixe deixa de ser perfeito.
O ombro (articulação glenoumeral) apresenta uma grande incidência de luxações quando comparado a outras articulações, sendo responsável por cerca de 45% dos casos em todo o nosso organismo. É a articulação que mais “sai do lugar”. Isso se deve a anatomia única e altamente diferenciada para a realização de movimentos em quase todas as direções.
Os primeiros relatos de luxação de ombro são encontrados em tumbas egípcias (3000-2500 a.C.), e foi Hipócrates (460 a.C.) que estabeleceu as primeiras formas de tratamento. Curiosamente, algumas técnicas descritas por ele são usadas até os dias atuais.
Entendendo a anatomia funcional:
O ombro é composto por diversas estruturas ósseas, ligamentares, tendíneas e articulares. Essa estrutura complexa faz movimentos de forma ampla, permitindo que posicionemos o braço e a mão em quase todos os planos tridimensionais. Ao mesmo tempo que ganhamos com o movimento, perdemos com a estabilidade, que nessa articulação, depende muito da tensão dinâmica (que aumenta ou diminui conforme solicitada) dos tendões e ligamentos. É como se a cabeça do úmero fosse a bola que a foca equilibra, ou uma grande bola de sorvete apoiada na casquinha.
As estruturas que “seguram” o ombro no lugar, e que podem estar lesadas na luxação do ombro são:
- parte óssea – o contato entre a glenóide e o úmero, apesar de pequeno, ajuda na estabilização do ombro.
- ligamentos e cápsula articular
- lábio da glenóide – envolve a glenóide, sendo ponto de inserção dos ligamentos e da cápsula do ombro. Além disso, aumenta a área e a profundidade de contato entre a glenóide e a cabeça do úmero.
- tendões do manguito rotador – a contração deles mantém a cabeça do úmero tracionada e centrada na glenóide durante o movimento.
Que tipo de movimento causa a luxação do ombro?
Há dois tipos mais importantes de luxação do ombro (articulação glenoumeral). O primeiro, e mais comum (cerca de 85% das vezes), ocorre quando o úmero sai para a frente da glenóide (anterior). O segundo, posterior, é menos comum e acontece quando o úmero (osso do braço) é forçado para trás da glenóide.
A luxação anterior da articulação glenoumeral ocorre com o ombro em posição de arremesso. Dizemos que ele se encontra em abdução (aberto para cima), extensão (desviado para trás) e rotação externa (rodado para trás). É comum em práticas esportivas e traumas por quedas com a mão apoiada no chão.
Já a luxação posterior, ocorre após uma queda com a mão apoiada no chão com o braço ligeiramente aduzido (como se estivesse cruzando a linha média do corpo em direção ao outro lado), ou em episódios convulsivos devido à contração muscular excessiva.
O que fazer na suspeita do ombro ter saído do lugar?
De forma geral, a luxação do ombro costuma ser bastante dramática. A dor é intensa, e algumas vezes é possível qualquer pessoa notar uma deformidade.
Se isso acontecer, procure imediatamente um pronto atendimento médico ou ortopédico. O profissional irá examiná-lo e como procedimento solicitará uma radiografia de urgência. Isso é o suficiente para iniciar o tratamento.
Caso seja confirmada a luxação do ombro, será necessário realizar uma manobra de redução, isto é, “colocar o ombro no lugar”. A manobra pode ser realizada por diferentes técnicas, todas com a mesma finalidade: restaurar a congruência articular.
A escolha da técnica a ser utilizada depende unicamente da preferência do médico que esta prestando o atendimento, e não deve ser realizada por pessoas não treinadas. Para seu conhecimento, a mais famosa delas é a chamada manobra hipocrática, também conhecida como “tração e contra tração”. O procedimento deve ser realizado imediatamente após o diagnóstico, no pronto atendimento ou em ambiente de centro cirúrgico. O uso de analgésicos endovenosos ou intra-articulares podem ajudar no controle da dor e facilitar a redução.
Caso o tratamento na fase inicial seja efetivo, o ombro será imobilizado com uma tipóia, e o paciente encaminhado para um seguimento ortopédico especializado. As decisões de como tratar a partir daí depende de inúmeros fatores que devem ser avaliados pelo especialista. Cada paciente deve conversar com o seu médico a respeito dos prós e contras do tratamento escolhido.
Quais são as complicações?
As complicações da luxação aguda do ombro nem sempre são identificadas na fase inicial. Às vezes, demoram algumas semanas ou meses para que os problemas secundários à luxação apareçam. Podemos citar:
- neuropraxia do nervo axilar – paralisação transitória das funções desse nervo. Se manifesta com formigamento e diminuição da sensibilidade na face externa do braço, podendo em alguns casos causar perda da força de levantamento lateral do ombro.
- fraturas – mais comum nas luxações de ombro em pessoas com mais de quarenta anos.
- lesão dos tendões do manguito rotador – a lesão desses tendões causada por luxação do ombro é muito frequente em pessoas mais idosas. Ocorre em cerca de três a cada dez pessoas com mais de quarenta anos, e ultrapassa os 80% em pacientes com mais de sessenta anos.
- luxação recidivante ou instabilidade glenoumeral crônica – condição em que o ombro “sai do lugar” com facilidade e repetidas vezes. Quanto mais jovem o paciente, maior a chance disso acontecer. Nove em cada dez pacientes com menos de vinte anos, que sofreram uma luxação aguda, poderão vir a ter esta complicação.